Artículos

Violência, conflito e omissão na proteção dos indígenas no Brasil: o caso Veron

Violence, conflict and omission in the protection of indigenous people in Brazil: the Veron case

Violencia, conflicto y omisión en la protección de los indígenas de Brasil: el caso Verón

Pietro de Jesús Lora Alarcón
Pontificia Universidad Católica de São Paulo , Brasil
Karine Cordazzo
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, Brasil

Revista Latinoamericana, Estudios de la Paz y el Conflicto

Universidad Nacional Autónoma de Honduras, Honduras

ISSN: 2707-8914

ISSN-e: 2707-8922

Periodicidade: Semestral

vol. 2, núm. 4, 2021

revistapaz@unah.edu.hn

Recepção: 30 Março 2021

Aprovação: 21 Maio 2021



DOI: https://doi.org/10.5377/rlpc.v2i4.11481

Cómo citar / citation: Lora, P.J y Cordazzo, K. (2021). Violência, conflito e omissão na proteção dos indígenas no brasil: o caso Veron, Estudios de la Paz y el Conflicto, Revista Latinoamericana, Volumen 2, Número 4, 80-98. https://doi.org/10.5377/rlpc.v2i4.11481

Resumo: O presente artigo examina e analisa a gravidade da situação de seletividade e criminalização secundária de indígenas, especialmente a orientação dirigida às agências de criminalização, oficiais e subterrâneas, para a execução de massacres de indígenas no Brasil. A metodologia utilizada inclui pesquisa bibliográfica e documental e a interpretação fundada na criminologia crítica. O objeto de conhecimento abordado é a ação penal originada pelo assassinato de Marcos Veron, liderança indígena no Estado de Mato Grosso do Sul – Brasil, na qual verificaram-se resquícios explícitos da violência estrutural enraizada nos aparelhos de controle social e nas decisões de instituições que deveriam ser imparciais. Palabras-chave Direitos Humanos; indígenas; justiça penal hegemônica.

Palavras-chave: Direitos Humanos, indígenas, justiça penal hegemônica.

Abstract: The present article examines and analyzes the seriousness of the situation of selectivity and secondary criminalization of indigenous, especially the guidance directed to criminal, official and underground agencies, for the execution of massacres of indigenous people in Brazil. The methodology used includes bibliographic and documentary research and interpretation based on critical criminology. The object of knowledge addressed is the criminal action originated by the murder of Marcos Veron, indigenous leader in the State of Mato Grosso do Sul - Brazil, in which there were explicit remnants of structural violence rooted in the social control apparatus and in the decisions of institutions that should be impartial.

Keywords: Human rights, indigenous people, hegemonic criminal justice.

Resumen: El presente artículo examina y analiza la gravedad de la situación de selección y criminalización secundaria de los indígenas, especialmente la orientación dirigida a las agencias de criminalización, oficiales y clandestinas, para la ejecución de masacres de indígenas en Brasil. La metodología utilizada incluye la investigación bibliográfica y documental y la interpretación basada en la criminología crítica. El objeto de conocimiento abordado es la acción criminal derivada del asesinato de Marcos Verón, líder indígena en el Estado de Mato Grosso do Sul, Brasil, en la que se encontraron huellas explícitas de la violencia estructural arraigada en los aparatos de control social y en las decisiones de instituciones que deberían ser imparciales.

Palabras clave: Derechos Humanos, indígenas, justicia penal hegemónica.

Extended abstract

Human disposability by ethnic criteria leaves behind a trail of massacre and destruction in indigenous communities. In this sense, this research seeks to highlight the discourse of ethnic neutrality that prevents us from seeing ethnicity and also prevents us from seeing how the criminal justice system acts selectively, guided by criminal stereotypes. And it's not just that. This supposed neutrality over time turns into complete blindness, preventing us from seeing how structural discrimination is interwoven at the very base of society, ranging from segregated schools, to isolated neighborhoods, to prejudiced political discourse, all to maintain the other as a social pariah. It is necessary to understand that the dismantling of this ethnically considered caste system necessarily involves an absolute commitment to ethnic justice, built on the pillars of human rights, respect for the other; in fact, a new social consensus on equality must take place in order for those deferred corpses - read, the indigenous people - to have, in fact, and in law, a dignified life. Understanding how punitive power creates enemies, builds scapegoats and slaughters them is the first step for the veil of neutrality to fall. In such a way, as drivers of critical criminological thinking, we have a responsibility to warn society about the risks traced to the massacre, notably those most vulnerable, as is the case with the indigenous people in Brazil. In this sense, with the criticism based on solid scientific pillars, the object of the present research is the analysis of the criminal action originated by the murder of Marcos Veron, indigenous leader in the State of Mato Grosso do Sul - Brazil, in which there were explicit remains of the structural violence rooted in the social control apparatus and in the decisions of institutions that should be impartial. Thus, despite adopting a primarily empirical stance - analysis of the Veron case - mediated by inductivism in order to expose the facts and versions about the emblematic case and its judgment, critical criminology allows to develop theoretically the premises that reflect the interest of the subordinate classes , based essentially on historical materialism as a way of analyzing the causes of this massacring selection and criminalization of the most fragile human beings, represented here by the indigenous people.

1. INTRODUÇÃO

Pode-se afirmar, sem temor a exageros, que no Brasil os órgãos que em tese estariam capacitados para assistir e proteger aos indígenas falharam sistematicamente no seu desiderato. Com efeito, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), jurídica e formalmente subordinados aos interesses estatais e de toda a sociedade, em vários períodos da nossa mais recente história demonstraram sua incapacidade para impedir que o massacre indígena pudesse ter terreno fértil. Na origem se situam os interesses do agronegócio, que forçaram a supressão da titularidade dos direitos humanos dos membros das comunidades indígenas para que o poderio econômico da agricultura pudesse ser instalado.

O fato é que as áreas ocupadas pelos indígenas são de peculiar interesse para o desenvolvimento nacional. Com essa premissa, agentes estatais, dentre outros atores como grupos corporativos nacionais e estrangeiros, justificam que é preciso empreender ações nessas áreas para o prestígio do interesse público. O que seria algo louvável em princípio, na verdade instala a pretensão de desmembrar e descaracterizar culturalmente grupos étnicos distintos. Notadamente as práticas não são só de diminuição, senão de eliminação de direitos dos povos indígenas.

No nosso estudo, fazendo um recorte epistemológico em termos de fronteiras internas do vasto Brasil e focando especificamente o Estado de Mato Grosso do Sul, defendemos que esta situação não é circunstâncial senão histórica, que persiste após a redemocratização pós Constituição de 1988 e que se encontra mascarada pelo discurso da neutralidade étnica. Destarte não é sem razão que o massacre dos membros da comunidade Guaranis-Kaiowás, agenciado por detentores do poder econômico nessa região, tornou-se um dos fatos que mais ganhou visibilidade no cenário nacional e internacional a partir das denúncias feitas à Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) no ano 2015.

De maneira que nossa hipótese não é construida a partir da ideia de que assistimos a uma era de retrocessos com relação aos direitos dos indígenas. Pelo contrário, estes povos alhures não conhecem a efetividade dos direitos humanos, da autonomia estampada na Constituição ou na Declaração da ONU de 2007. A luta que travam é diária e à base de sangue, pela defesa das suas terras, pela sua organização social, línguas e tradições, que na prática tem sido rejeitada e até considerada desprezível aos olhos da supremacia branca. Trata-se, por isso, da luta pelo reconhecimento da sua dignidade.

Com estes elementos de extrema gravidade e a partir desta hipótese o nosso artigo aborda, em perspectiva criminológica crítica e tendo em vista a interpretação e aplicação do direito – dogmática jurídica - a seletividade e criminalização secundária de indígenas no Brasil e particularmente o caso do assassinato de Marcos Veron, liderança indígena do Mato Grosso de Sul. Os resultados da nossa pesquisa, bibliográfica e documental, deixa um saldo científico que demonstra os resquícios da violência estrutural enraizada nos aparelhos de controle social e nas decisões de instituições que deveriam ser imparciais.

2. SOBRE OS ASPECTOS METODOLÓGICOS E AS DIFICULDADES DA PESQUISA DE UM CASO EM ANDAMENTO

A abordagem da presente pesquisa está calcada em uma perspectiva que não seguirá exclusivamente a interpretação no campo da Teoria Geral do Direito ou da Dogmática, senão que também ingressará nos baluartes da criminologia crítica. Como bem assinala Boaventura de Sousa Santos (1996, p. 46) “o direito, que reduziu a complexidade da vida jurídica à secura da dogmática, redescobre o mundo filosófico e sociológico em busca da prudência perdida”.

Assim, apesar de ser adotada uma postura primeiramente empírica – como corresponde a uma análise de caso – mediada pelo indutivismo, no intuito de expor os fatos e versões correspondentes à ação, seu processo e julgamento, o auxílio da criminologia crítica permite desenvolver teoricamente outras premissas, que permitem visualizar tendências, limites e possibilidades dos atores envolvidos. Tais premissas distinguem o interesse das classes dominantes e subalternas, servindo de ponto de partida para explicar as causas de uma massacrante seleção e criminalização de seres humanos fragilizados, no caso, os indígenas.

A criminologia crítica, nessa trilha, não somente expõe seu compromisso com a defesa dos direitos humanos dos indígenas, senão que remete “[...] desde el punto de vista político e ideológico, a un programa de defesa de los Derechos Humanos que pretende “desaparecer la función punitiva del sistema de justicia penal formal mediante la búsqueda de diversas alternativas a la solución de los conflictos” (Olivar, 1995, p. 278). Bem por isso, “[...] la misma debe estar dirigida a resguardar los derechos fundamentales de los pueblos indígenas y demás grupos étnicos frente al Estado nacional, sin pretender reemplazar su propria dinámica y desarrollo” (Olivar, 1995, p. 278).

Nessa perspectiva metodológica, para a criminologia crítica a análise do fator histórico e na prática quase que exclusivamente punitivo do sistema penal é imprescindível. É esse exame que conduz a visualizar a instrumentalização da pena dentro da lógica da manutenção e reprodução das desigualdades sociais. Esta é uma questão que ampara os estudos críticos e que adquire singular importância na chamada pós-modernidade ou modernidade recente, na ideia de compreender o que não está dado, o que está por trás de todo um discurso de poder e de ideologia1. Naturalmente, este posicionamento postula, ao final, um compromisso com a mudança social, evidenciando a lógica atual que dita todo o sistema, qual seja, a do capital. Em tal sentido:

[...] a atenção da nova criminologia, da criminologia crítica, se dirigiu principalmente para o processo de criminalização, identificando nele um dos maiores nós teóricos e práticos das relações sociais de desigualdade próprias da sociedade capitalista, e perseguindo, como um de seus objetivos principais, estender ao campo do direito penal, de modo rigoroso, a crítica do direito desigual. Construir uma teoria materialista (econômico-política) do desvio, dos comportamentos socialmente negativos e da criminalização, e elaborar as linhas de uma política criminal alternativa, de uma política das classes subalternas no setor do desvio: estas são as principais tarefas que incumbem aos representantes da criminologia crítica, que parte de um enfoque materialista e estão convencidos de que só uma análise radical dos mecanismos e das funções reais do sistema penal, na sociedade tardo-capitalista, pode permitir uma estratégia autônoma e alternativa no setor do controle social do desvio, ou seja, uma “política criminal” das classes atualmente subordinadas. (Baratta, 2014, p. 197).

De maneira que, adotada esta fórmula metodológica, não basta ser um mero espectador diante dos fatos. Como assevera Gabriel Ignacio Anitua (2008, p. 573), “o ser humano não tem o destino predeterminado, nem tem por que conformar-se com o que existe”. Por esta razão, superando-se a esfera do individualismo, certamente se ingresssa no exame do objeto de estudo com um enfoque mais realista.

Destarte, nas trincheiras da análise crítica e na latência do que foi exposto, o método adotado nesta pesquisa ficou devidamente esclarecido, optando-se pela abordagem que caminha da análise concreta – o caso Veron – à análise quanto à seletividade e criminalização secundária de indígenas, da forma como se conduz o procedimento na Justiça Penal hegemônica, elucidando o que está subjacente aos massacres e possibitando desvelar a lógica das relações de poder históricamente reproduzidas naquela região do Brasil.

Assim, cumpre esclarecer que estamos diante da ação penal n. 2003.60.02.000374-2, oriunda da 1ª Vara Federal da cidade de Dourados, no Estado do Mato Grosso do Sul - Brasil, originada pela denúncia de violentos ataques contra os indígenas da comunidade Guarani Kaiowá no município de Juti e que resultou na morte do líder indígena Marcos Veron.

O proceso judicial contém 29 volumes, totalizando mais de 7 mil páginas. No momento de conclusão desta pesquisa constata-se que a última movimentação dos autos data de 25 de agosto de 2020, quando na oportunidade foi juntada petição de recurso especial e extraordinário. O recurso questiona decisão da quarta seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que, por maioria, negou provimento a embargos infringentes. Por sua vez, a determinação embargada foi aquela na qual o Tribunal julgou apelação criminal e deu parcial provimento ao recurso do Ministério Público Federal para submeter um dos réus a novo julgamento pelo tribunal do júri.

Também esclarecemos que o acesso aos autos com intuito de pesquisa foi facilitado porque o processo não está resguardado sob segredo de justiça e não houve trânsito em julgado. Sem embargo, não foi obtida autorização para retirar o processo físico do recinto do Tribunal Regional Federal da 3ª Região para extração de cópias. Somente foi concedida autorização para vista dos autos no balcão do gabinete do Desembargador Federal Mauricio Kato, na qual se encontrava à época, em 13 de abril de 2018.

Em que pese estas circunstâncias os pesquisadores receberam autorização para a extração de fotografias das partes mais relevantes do processo, cujo resultado foram 947 páginas dos autos fotografadas, que correspondem ao material analisado e que oferecem o panorama a seguir na sequência dos capítulos do presente artigo.

3. O CASO MARCOS VERON

Inicialmente, consta na denúncia (Processo n° 2003.60.02.000374-2, pp. 2-24) que em 11 de janeiro de 2003 um grupo de indígenas, constituído por homens, mulheres e crianças, teriam ingressado na Fazenda Brasília do Sul, na cidade de Juti, no Estado de Mato Grosso do Sul – Brasil, e ocupado uma pequena parte daquela terra.

Os indígenas, que reconheciam aquele lugar como terra de ocupação tradicional da comunidade Takuara, chegaram naquele local já ao anoitecer, dando início à instalação de um pequeno acampamento, que continuou sendo montado no dia seguinte, ou seja, no dia 12 de janeiro de 2003 – domingo –, chegando a constar a marca de mais ou menos oitenta índios. Há que lembrar que tal conceito não é fruto do capricho, mas resultado do enquadramento constitucional resultante do texto do artigo 231 da Carta de 1988, que determina seus direitos originários sobre as terras que ocupam.

Nesse mesmo dia os indígenas receberam a visita do administrador da fazenda, Nivaldo Alves de Oliveira, que na companhia de uma outra pessoa e de policiais da DOF – Departamento de Operações de Fronteira –, assegurou que os acampados poderiam retirar madeira para lenha e para o término da montagem dos seus abrigos. Disse ainda a ocupação seria resolvida no dia seguinte, segunda-feira, mediante acordo a ser firmado na presença da Polícia Federal e da Funai.

Na verdade, o acordo nunca aconteceu. Da denúncia se desprende a estratagema do administrador da fazenda para ganhar a confiança dos indígenas e realizar um ataque premeditado e efetuado na madrugada do dia 13 de janeiro. No entardecer do dia 12 de janeiro, o Sr. Araldo Veron estava dirigindo o veículo Toyota da Comunidade Indígena, a fim de trazer mantimentos e alguns outros membros que iriam juntar-se ao grupo acampado na fazenda. Ao chegar foram interceptados por uma viatura da DOF e advertidos que deveriam dirigir-se rapidamente ao acampamento e voltar, pois, na área da fazenda não poderia entrar carro particular, retornando ao acampamento oficial – em Porto Cambira.

No entanto, com a intenção de trazer mais mantimentos, o veículo fez uma segunda viagem, nesta estava além do Sr. Araldo Veron, que dirigia, as indígenas Julia Veron e Sandra na cabine do veículo; na carroceria se encontravam o adolescente Reginaldo Veron, Felipa Benites e Beta Vilhalba e mais três crianças, com idades de seis, sete e onze anos. Ao se aproximarem da Fazenda Brasília do Sul, depararam-se com vários veículos e homens fortemente armados, cujo nítido propósito era impedir o acesso dos indígenas à Fazenda.

Diante dessa situação a indígena Julia Veron disse ao seu filho Araldo algo como “vira logo, ta fechado aí, vira logo, não para”, o que fez Araldo realizar uma manobra de retorno. Nesse instante, Julia Veron teria ouvido de alguns daqueles homens que se encontravam na porteira da fazenda algo como “oh bugre, para aí, vou te matar” (Processo n° 2003.60.02.000374-2: 784). Logo, as pessoas que se encontravam postadas diante da fazenda começaram a atirar na direção do veículo dos indígenas, que, a essa altura, já trafegava em direção oposta, dando-se início, então, a uma perseguição.

Segundo a denúncia, em reprodução simulada dos fatos, a perseguição durou cerca de oito quilômetros até uma bifurcação que dava acesso ao município de Caarapó, local mais habitado nas redondezas. Tal perseguição resultou em ferimento à bala na perna de Reginaldo Veron, além de buracos de projetis no veículo Toyota.

Conforme declaração dos indígenas que ocupavam o veículo, quem teria realizado a perseguição seriam os denunciados Estevão Romero, apontado como o motorista do veículo, Jorge Cristaldo Insabralde e Carlos Roberto dos Santos, apontados como autores dos disparos, e possivelmente mais duas pessoas até aquele momento ainda não identificadas.

Entretanto, o pior ainda estava por acontecer. Na madrugada do dia 13 de janeiro, entre três e quatro horas da manhã, um grupo fortemente armado ingressou no acampamento e executou um verdadeiro massacre contra os índios. Os indígenas que não lograram êxito em fugir de imediato foram alvos de agressões e humilhações. O Cacique Marcos Veron, de 73 anos de idade, faleceu vítima do espancamento que sofreu.

O grande grupo de homens, na sua maioria funcionários da fazenda, faziam uso de três veículos pertencentes à própria fazenda. Tais pessoas estavam munidas de armas de fogo e rojões e capturaram sete indígenas: o cacique Marcos Veron; seu filho, Ládio Veron; Adélcia Martins – esposa de Ládio; Cesar Martins Veron – filho de Ládio; Cipriana Martins – cunhada de Ládio; Geisabel Veron – filha de Marcos Veron, grávida de sete meses e Valdecir Caballeiro – neto de Marcos Veron.

Consta ainda na denúncia que antes de ocorrer a efetiva captura dos sete indígenas foram praticadas toda sorte de agressões contra esses e contra outros que ainda estavam no acampamento, mas que lograram empreender fuga.

Para que se possa elucidar melhor a magnitude das arbitrariedades e violações aos direitos humanos cometidas, há que dizer que Ládio Veron teve sua barraca destruída, foi imobilizado por dois homens e agredido com socos e pontapés por um terceiro, reconhecido por Ládio como sendo o denunciado Estevão. Ládio foi conduzido, mediante mais agressões, até uma camionete Silverado vermelha, na qual seria, posteriormente, amarrado e sequestrado até um local distante da Fazenda. Ainda, antes mesmo de iniciado o deslocamento, foi retirado da camionete e cercado por vários homens, teve encostadas bem próximas ao seu corpo quatro tochas, sob a ameaça de arremessarem um líquido, provavelmente inflamável, que se encontrava num galpão seguro por um dos agressores. Tal foi a proximidade das tochas com o seu corpo, num claro propósito de fazê-lo passar por intenso sofrimento físico e mental, que o laudo do exame médico legal aponta um “chamuscamento de pele em região anterior ao tórax” (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 14), além de inúmeras outras lesões em outras partes do corpo.

Outro exemplo da extensão da violência perpetrada, foi a praticada contra Geisabel Veron que, “mesmo grávida de sete meses, foi puxada pelos cabelos, jogada no chão, recebeu um soco na cabeça e um pontapé na parte superior externa de sua perna, tendo, ainda, após sequestrada, sido largada na estrada completamente nua” (Processo n° 2003.60.02.000374-2, pp. 8-9).

Quanto ao cacique Marcos Veron, que no momento do ataque dormia na mesma barraca em que estavam sua filha Geisabel Veron, Mario Turíbio e outras quatro pessoas, tão logo retirado da barraca pelos agressores foi jogado no chão, passando a ser alvos de socos, pontapés, coronhadas na cabeça. Foi colocado na carroceria da camionete Silverado Vermelha onde ficou com os demais prisioneiros.

Os reféns foram levados pelos acusados em direção ao acampamento oficial dos indígenas na beira da estrada MS-156, próximo ao rio Dourados. No entanto, como estava prestes a amanhecer, decidiram deixá-los num trecho da estrada próxima à fazenda conhecida como Santa Claudina. Porém, não satisfeitos com todas as agressões já praticadas, consta na denúncia que o cacique Marcos Veron foi retirado da carroceria do veículo e arremessado de imediato no chão, instante seguinte o denunciado Nivaldo, auxiliado pelo denunciado Carlos Roberto dos Santos, que segurava as costas do cacique Marcos Veron, iniciou uma série de golpes com a coronha de uma arma longa na cabeça deste, os quais, foram apontados como golpes definitivos na produção do resultado morte.

Ládio Veron que assistiu toda aquela cena porque ainda permanecia amarrado na carroceria da camionete, pedia aos agressores para que parassem com a violência contra seu pai e obtinha como resposta “fica calmo, tua hora não chegou ainda” (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 10). Ládio, após ser desamarrado, foi jogado ao chão e ameaçado novamente, desta vez com o cano de uma arma encostado na sua cabeça e, ao mesmo tempo, uma advertência para que não tentaram mais entrar na “fazenda do patrão”. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 10)

Embora conduzido a hospital da egiçao, o cacique Marcos Veron não resistiu aos ferimentos, vindo a falecer naquele mesmo dia, às 11h30 da manhã.

Ainda, na manhã daquele dia, seguindo ordens do denunciado Nivaldo, os funcionários da Fazenda Brasília do Sul foram flagrados por policiais federais e por um funcionário da Funai, tentando limpar os vestígios do acampamento que os indígenas haviam montado.

Logo após este resumo, que mostra a gravidade dos fatos, a pesquisa identificou as imputações na denúncia com a finalidade de fazer o devido seguimento. Foram denunciados:

Nivaldo Alves de Oliveira como um dos autores das agressões praticadas contra o cacique Marcos Veron, ainda no interior da fazenda, também, como o motorista da camionete em que foram transportados os índios sequestrados; como autor das coronhadas contra o cacique Marcos Veron fora da fazenda; como quem dirigia a atividade dos demais agentes, buscando orientações pelo rádio da camionete quanto ao destino que seria dado aos índios sequestrados.

Carlos Roberto dos Santos foi apontado como a pessoa que teria pressionado o joelho sobre as costas do cacique Marcos Veron para que o denunciado Nivaldo pudesse lhe desferir as coronhadas fatais; como a pessoa que acompanhava o denunciado Nivaldo na camionete que transportava os índios sequestrados; como um dos autores das agressões praticadas contra o cacique Marcos Veron, ainda no interior da fazenda.

Estevão Romero apontado como um dos agressores de Ládio Veron; como um dos autores das agressões praticadas contra o cacique Marcos Veron, ainda no interior da fazenda; como um dos integrantes do comboio que deslocou os índios sequestrados para fora da fazenda; como uma das pessoas próximas quando da tortura, com fogo, praticada contra Ládio Veron; como a pessoa que teria agredido vários indígenas durante o ataque noturno e correu atrás de outros índios.

Por fim, Jorge Cristaldo Insabralde apontado como um dos autores das agressões praticadas contra o cacique Marcos Veron, ainda no interior da fazenda; como a pessoa que teria amarrado Ládio Veron na carroceria do veículo que deslocou os índios sequestrados para fora da fazenda; como um dos integrantes do comboio que deslocou os índios sequestrados para fora da fazenda; como a pessoa que segurava a corda que prendia as mãos de Ládio Veron para trás, quando este foi vítima da prática de tortura com fogo; como a pessoa que teria segurado o braço de Cipriana Martins e jogando-a contra uma cerca de arame. E, atendendo a determinações de Nivaldo, alguns funcionários dirigiram-se até o local onde os índios estavam acampados e procuraram eliminar os vestígios indicativos da presença dos índios, um desses funcionários que se dirigiu até o local sendo o denunciado Estevão. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, pp. 15-17)

Recebida a denúncia, houve desmembramento dos autos com relação ao acusado Nivaldo Alves de Oliveira – de acordo com o artigo 366 do Código de Processo Penal Brasileiro2. Foi acrescentado nas alegações finais do Ministério Público dispositivo pertinente à tentativa de homicídio, com a consequente sentença de pronúncia de Carlos Roberto dos Santos, de Estevão Romero e Jorge Cristaldo Insabralde.

A defesa interpôs recurso em sentido estrito contra a sentença de pronúncia que foi mantida em sede de reconsideração, subindo os autos para o Tribunal Regional Federal – TRF- da 3ª Região e tendo a Segunda Turma, em sessão realizada em 29 de novembro de 2005, por unanimidade, negado provimento ao recurso. Baixado os autos, foi suscitado conflito de competência, e ao final determinou-se o seguimento no Juízo da 1ª Vara Federal de Dourados-MS.

Vale apontar que o Ministério Público Federal requereu perante o TRF da 3ª Região o desaforamento do referido processo para o Tribunal do Júri da Seção Judiciária de São Paulo/SP. O Órgão Especial em 11 de fevereiro de 2009, por unanimidade, deferiu o pedido deslocando o julgamento para o Tribunal do Júri da 1ª Subseção Judiciária de São Paulo.

4. QUANDO O VÉU DA NEUTRALIDADE CAI POR TERRA

Feitas estas considerações iniciais, que por si só já são capazes de elucidar a tentativa de neutralização e eliminação física de todos os integrantes daquele povo indígena, passa-se, adiante, à análise de forma detalhada do processo, advertindo que mais do que um simples estudo de caso, o propósito é retirar o véu da neutralidade étnica que paira sobre ele, a fim de visualizar os verdadeiros atores desse massacre, que não se restringe apenas àqueles homens fortemente armados na Fazenda Brasília do Sul. Em resumo, é aqui que passamos do concreto dos fatos e dados coletados às análises e questionamentos que possibilitam interpretar e concluir sobre o que realmente acontece, a partir de premissas, e comprovação da hipótese.

Como ponto de partida, frisse-se que no Brasil historicamente existe a prática, especialmente em áreas consideradas de interesse para o desenvolvimento nacional, de “[...] ações coercitivas com o objetivo de desmembrar e descaracterizar culturalmente grupos étnicos distintos” (Roth, 2016, p. 58). Notadamente, estas ações são desenvolvidas por agentes de Estado e grandes empresários e repercutem na dizimação dos direitos constitucionais, legais e daqueles constantes e documentos internacionais como a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas.

Como se sabe, a Declaração é um documento abrangente que aborda os direitos dos povos indígenas. Em documento emitido pela UNESCO, a organização esclarece que esta:

Não estabelece novos direitos, mas reconhece e afirma direitos fundamentais universais no contexto das culturas, realidades e necessidades indígenas. A Declaração constitui um instrumento internacional importante de direitos humanos em relação a povos indígenas porque contribui para a conscientização sobre a opressão histórica impetrada contra os povos indígenas, além de promover a tolerância, a compreensão e as boas relações entre os povos indígenas e os demais segmentos da sociedade3.

A situação que colocamos pode ser inclusive verificada no Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade, de 2014, que expõe categoricamente a violência perpetrada contra os direitos humanos dos indígenas.

Certamente, mesmo que os crimes evidenciados pela Comissão Nacional da Verdade (2014, p. 205) “[...] pareçam apenas mais uma expressão da brutalidade do regime ditatorial e do radicalismo nacionalista dos anos 1960 a 1970, não podemos analisar a violência contra o índio de forma descontinuada da história brasileira”. O massacre perdura desde à colonização até a redemocratização pós Constituição de 1988, velado, mascarado pelo discurso da neutralidade étnica.

Vale a pena destacar este conceito, que aqui é vinculado assemelhando-se àquele elaborado por Michelle Alexander, cujo foco de pesquisa são as questões raciais. Aduz a autora estado-unidense que “por ser deliberadamente ‘daltônico’ – e não cego – é que o sistema de justiça mantém seu funcionamento seletivo e pode sustentar um discurso que apregoa a neutralidade (e a imparcialidade), ao mesmo tempo que opera de modo seletivo contra pessoas negras”. (Alexander, 2017, p. 10)

É possível, in paralelum, transportar a ideia da neutralidade racial para o caso brasileiro com a problemática dos indígenas constantando-se a difusão da crença de que em nosso país não mais substistiria qualquer tipo de discriminação contra indígenas e mais, de que o sistema de justiça criminal seria notadamente democrático e multiético. Esse véu da neutralidade enconbre uma série de práticas masacrantes, que visualizaremos nesta análise.

Nesse sentido, ao se fazer um recorte epistemológico para a região de frontera, mais especificamente no Estado de Mato Grosso do Sul, o que verificamos é que atualmente o massacre dos Guaranis-Kaiowás se tornou um dos casos mais visíveis no cenário nacional e internacional, notadamente a partir das denúncias feitas à Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), na esfera da Organização dos Estados Americanos (OEA) em 20154, que aportam provas contundentes dos benefícios diretos obtidos por alguns poucos detentores do poder econômico com o aniquilamento sistemático dos povos indígenas.

Enfrentar o tema, à luz do caso que examinamos, implica avançar a algumas particularidades. Destacaremos um depoimento do funcionário da Fazenda, Aparecido Carmona da Silva, no qual relata um diálogo com o acusado Carlos Roberto dos Santos, logo após a perseguição contra o carro dos indígenas. Nas suas palavras, ele indagou a Carlos Roberto se não estavam trabalhando. A resposta foi: “que nada, nóis não tava trabalhando nada, tava atropelando os índio, metendo o cacete neles [sic]” e, “fizemo o maior bombardeio, fizemo o maior regaço [sic]”. Naquele momento, a esposa do depoente teria interpelado Carlos Roberto sobre o porquê estariam fazendo aquilo e Carlos Roberto respondeu “nóis tem que matá mesmo, tem que descê o cacete [sic]”. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, pp. 933-934)

Também, o depoimento em juízo do adolescente Reginaldo Veron – alvejado na perna durante a perseguição –, esclarece a motivação dos agressores, relatando “que durante a manobra para retornar na estrada o grupo de pessoas começou a gritar ‘pare [sic] aí seus bugres que querem tomar a terra dos outros’”. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 787)

Também em juízo, a indígena Adélcia Martins,

[...] reconhece os três acusados presentes nesta audiência como pessoas que participaram das agressões naquela noite; o acusado Jorge batia na cabeça de Marcos Veron com uma arma e ‘se jogava sobre o corpo de Marcos’; estas agressões aconteceram no acampamento; [...] o acusado Estevão batia em Marcos com uma arma, dava ‘coices nele’, e se jogava sobre o corpo de Marcos, que estava caído no chão, e gritava ‘oh goleiro Tafarel [...] (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 817).

Todavia, também é preciso ressaltar a intenção do grupo de agressores em promover um castigo mais intenso ao cacique Marcos Veron – que foi espancado até a morte – e ao seu filho Ládio Veron – vítima de tortura –. Esta sanha pôde ser verificada através das declarações prestadas pela indígena Cipriana Martins, “que os homens falavam que queriam pegar Ládio e Marcos porque eram caciques”. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 820)

Por isso pode-se concluir, ante o exposto, depoimentos e dados obtidos, que o objetivo do grupo era conseguir a privação da liberdade das principais lideranças da Comunidade Indígena Takuara, as quais já eram conhecidas pelos agressores, em razão de ocupação anterior daqueles indígenas, também na Fazenda Brasília do Sul. O sequestro das lideranças só seria possível com a dispersão, mediante fuga, dos demais indígenas que compunham o numeroso grupo de aproximadamente oitenta indivíduos.

No tocante à morte do cacique Marcos Verón, o indígena Ládio Veron relatou, em juízo que,

[...] o acusado Carlos participou destas agressões e foi a pessoa que segurou o pescoço de seu pai para retirá-lo da carroceria da camionete, antes de abandoná-los; o acusado Carlos colocou os joelhos na cintura de seu pai para possibilitar que o administrador da fazenda, desse coronhadas na cabeça de Marcos Veron [...] (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 797)

Cumpre ainda o registro que outras pessoas, além dos funcionários da Fazenda, foram contratadas para participar do massacre. Funcionarios da fazenda atestaram que Antonio Rodrigues já teria sido contratado para prestar seus serviços de segurança da propriedade quando da anterior ocupação e, que habitualmente prestava “serviços de expulsão de índios aos proprietários rurais que estiveram com suas fazendas ocupadas”.

Nas suas alegações finais, a defesa apontou para a inocência dos acusados e a culpa dos indígenas pelo conflito. É sintomática a citação da defesa de trecho de decisão que julgou procedente a concessão de liminar em ação possessória, na qual um magistrado – que inclusive foi candidato ao governo no Estado de Mato Grosso do Sul em 2018 –, teria aduzido que o proprietário da Fazenda Brasília do Sul poderia sim ter se valido do desforço físico. Nas palavras do magistrado, “se não fosse assim, o poder público estaria legalizando o arbítrio, a espoliação, as invasões, em suma o total desrespeito à posse e à propriedade. Ai, o proprietário teria que tirar no porrete os invasores. E até que pode”. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 1.638). Como se vê: indisfarçável a parcialidade do magistrado.

Logo, sustentou a defesa não se tratar de competência da Justiça Federal, a quem conforme o artigo 109 da Constituição compete processar a julgar a causa, tendo em vista a suposta inexistência de envolvimento de interesses gerais dos indígenas. Nada mais distante da interpretação do artigo, especialmente porque seu inciso XI aponta taxativamente que o juiz federal decide sobre “a disputa sobre direitos indígenas”. Quanto às testemunhas arroladas pelo Ministério Público Federal a defesa alegou que por serem vítimas e parentes da vítima Marcos Veron, teriam interesse em mentir e agravar a situações dos acusados. Ora, nas palavras da defesa “[...] sua insensibilidade a decisões judiciais, mostra bem seu perfil divorciado do certo, do honesto, do correto e do justo. Mostra que elas são hospedes constantes da violência e da agressividade”. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 1.648)

Mesmo assim, os réus foram pronunciados pelo Juízo Federal da Subseção Judiciária de Dourados, o qual determinou a submissão dos réus a julgamento pelo Tribunal do Júri na data de 23 de abril de 2007. Em razão disso, o Ministério Público Federal requereu ao TRF da 3ª Região, pedido de desaforamento do julgamento pelo Tribunal do Júri Federal da 2ª Subseção Judiciária de Mato Grosso do Sul-Dourados, por haver fortes indícios sobre a parcialidade do júri. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 2.603)

Os argumentos do desaforamento dizem respeito à repercussão nacional e internacional provocada pelo brutal assassinato da liderança indígena. Consta, em Relatório elaborado pelo Conselho Indigenista Missionário – relativo à violência praticada contra os Povos Indígenas no Brasil entre 2003 e 2005 –, que só no ano de 2003 foram registrados 26 episódios de conflitos referente à demarcação de terras tradicionais, sendo que destes, 23 aconteceram no Estado de Mato Grosso do Sul5.

O assassinato do cacique foi também objeto do Relatório elaborado pela Anistia Internacional, que expressou preocupação quanto ao clima de ameaça e violência sempre presentes, além do mais, que a sobrevivência dos próprios indígenas – não apenas dos Guaranis-Kaiowás – estivesse em perigo6.

Mas, o destaque no pedido de desaforamento foi a existência de fundadas dúvidas sobre a imparcialidade do júri. A repercussão do caso exigia, acima de tudo, a ocorrência de um julgamento imparcial a ser realizado pelos membros do Conselho de Sentença.

Na verdade, foi verificado que os réus e o réu foragido não são os únicos perpetradores da violência em face dos indígenas Guarani Kaiowá da Terra Indígena Takuara. Em Inquérito Policial foram indiciadas outras 24 pessoas, sendo uma delas o proprietário da Fazenda Brasília do Sul, Jacintho Honório da Silva Filho, pessoa de enorme influência econômica e política na região e que, como consta nos autos, tentou fabricar provas necessárias à defesa dos réus manipulando e comprando depoimentos de outros indígenas. Intuiu-se que os mesmos artifícios provavelmente poderiam ser utilizados contra os membros do Conselho de Sentença, o que evidenciou patente dúvida quanto à imparcialidade do júri.

Também, em 2004, o Procurador da República, que subscreveu o pedido de desaforamento, foi procurado em mais de uma oportunidade, em seu gabinete, por um Juiz Estadual do Tribunal do Júri da Comarca de Dourados, que nas visitas sempre esteve acompanhado da esposa, que era advogada (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 2.621). O juiz relatou que teria sido apresentado a Jacintho Honório da Silva Filho e este teria indagado o que poderia ser feito pelos réus presos desde 2003. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 2.622)

O Juiz esclareceu ao Procurador que pretendia colocar sua esposa como advogada dos réus, quando na verdade quem faria todo o trabalho seria ele mesmo, indagando inclusive sobre o que seria preciso ser dito ou confessado pelos réus para que pudesse haver a apresentação de parecer favorável pelo Ministério Público Federal em eventual requerimento de revogação de prisão preventiva, a ser subscrito por sua esposa (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 2.622). O membro do MPF esclareceu que eventual confissão ou delação premiada, se presentes os requisitos, só ensejaria a aplicação dos benefícios previstos em lei, como a incidência de causa de diminuição da pena. Frise-se que até o momento do requerimento de desaforamento, nenhum pedido de revogação da prisão preventiva havia sito feito. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 2.622)

Houve ainda outro episódio envolvendo o Juiz Estadual. Em 17.04.2007, um servidor público federal, prestou depoimento na Procuradoria da República em Dourados, relatando que em 04.07.2006 assistia uma sessão do Tribunal do Júri presidida pelo magistrado, quando esse, após proferir sentença, dirigiu-se aos membros do Conselho de Sentença e às pessoas presentes afirmando que lamentava os assassinatos de dois policiais civis ocorridos em 01.04. 2006 em fazenda invadida por indígenas, localizada no município de Dourados. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 2.623-2.624)

Salientou que o magistrado fez questão de destacar que havia outros inúmeros conflitos envolvendo invasões de propriedades particulares por indígenas e que só estariam ocorrendo pela atuação do Procurador da República – que requereu o pedido de desaforamento – e de um antropólogo do MPF. Ainda, afirmou que o membro do MPF só estaria agindo daquela forma por vir de outro estado da federação, desconhecendo a realidade da região (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 2.624). O julgador teria dito,

[...] esquece aquele Procurador que o bairro de Copacabana, local em que certamente possui um apartamento, também já foi terra ocupada por índios Tamoios. Será que esse Procurador também defenderia os interesses dos índios se esses invadissem o seu apartamento? [...] (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 2.624)

Como destaca o membro do MPF no pedido de desaforamento, tal discurso proferido pelo magistrado estadual foi dirigido a pessoas que poderiam vir a constituir o Conselho de Sentença do Tribunal do Júri Federal, uma vez que este não possui lista própria de jurados, necessitando, por essa razão, recorrer à empréstimo à lista existente no Tribunal do Júri Estadual da Comarca de Dourados. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 2.626)

Portanto, concluímos que agiu-se em sintonia com os postulados constitucionais e as convenções internacionais de direitos humanos ao se verificar que, não bastasse o poder e influência econômica de Jacintho Honório da Silva Filho – proprietário da Fazenda Brasília do Sul –, o mesmo estaria assistido por Juiz do Tribunal do Júri Estadual da Comarca de Dourados, ao ser feito o desaforamento por notório impedimento à realização do julgamento dos réus pelo Tribunal do Júri Federal da Subseção Judiciária de Dourados, resultado de fundadas dúvidas acerca da imparcialidade dos jurados que comporiam o Conselho de Sentença.

Houve, no caso, desaforamento para a Seção Judiciária de São Paulo – localidade abrangida pela competência do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que estaria livre da influência econômica e política de Jacintho Honório da Silva Filho.

Cumpre, sem embargo, afirmar que chama a atenção ainda, no pedido de desaforamento, o que traz à tona o Ministério Público Federal sobre a existência de uma moção de protesto realizada pela Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso do Sul, aproximadamente dois meses após o assassinato do cacique Marcos Veron.

Os parlamentares teceram críticas ao que qualificaram de invasões de propriedades particulares pelas comunidades indígenas utilizadas como massa de manobra de grupos que desejam a prática de ilegalidade. Ademais, erigiram críticas quanto à realização do enterro do cacique num pequeno trecho do território reivindicado pelos Guarani Kaiowá e por eles denominado de Takuara. Resulta sintomática a constatação na nossa pesquisa que este fato causou mais indignação aos parlamentares do que o próprio assassinato do líder indígena, espancado até a morte aos 73 anos de idade – sem contar os tantos outros atos violentos contra os demais indígenas naquela oportunidade.

Sem contar, é claro, com o impulso dado a tal perspectiva de neutralização dos indígenas pelos meios de comunicação da região. Veja-se, no dia 03 de abril de 2006, em editorial do Jornal O Progresso, de grande circulação na região do município de Dourados-MS, destacava, “[...] esses índios, premiados pela imprensa e tomados de coragem pelo álcool que consomem, estão espalhando a barbárie por todo o Estado e, infelizmente, devem estar orientados por eminências pardas da causa indígena [...]”. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 2.631)

O editorial foi objeto de representação pelo Conselho Nacional de Combate à Discriminação e que resultou na abertura de um inquérito policial para apurar a prática de racismo contra a população indígena.

5. OS ÍNDIOS QUE “NÃO SÃO ÍNDIOS”

O pedido de desaforamento assentou-se sobre nota técnica de n. 002/2007, redigida por um analista pericial em antropologia, solicitada pelo órgão ministerial e que teve como escopo discutir a percepção dos locais e regionais quanto às populações Kaiowá do Mato Grosso do Sul e o efeito dessas nas relações interétnicas, com especial atenção aos Kaiowá da Terra Indígena Takuara, no município de Jutí-MS.

Segundo o antropólogo, no Estado de Mato Grosso do Sul os brancos carecem de conhecimento histórico sobre as populações nativas, especialmente os vinculados ao modo de produção capitalista agropecuária (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 4.921). Para eles a produção de subsistência indígena é objetivada como inexistente e os habitantes locais os caracterizam como preguiçosos, mal aproveitadores das terras que dispõe. O indígena é considerado um estranho e, praticamente tudo que se sabe sobre ele, é produzido externamente através das imagens que lhe chegam, compondo um paradigma, segundo o qual o índio é bêbado, invasor de terras, preguiçoso e traiçoeiro.

A repetida verbalização de que os Kaiowá não são índios, porque índios são aqueles da Amazônia, soma-se à representação de que também não são índios, porque paraguaios. A recorrência desses clichês forma uma imagem nítida de um índio que não é índio, imputando ao Kaiowá uma identidade que o torna desacreditável perante a sociedade envolvente, algo contra o qual nada pode fazer.

Na história jurídica do país deve-se lembrar que a luta pela demarcação da terra no Estado de Mato Grosso do Sul remonta ao final de 1970. Entretanto, o dispositivo do art. 67 do ADCT da Constituição Federal do Brasil de 1988 que previa a demarcação das terras do qual trata o art. 231 da Carta Magna7, num prazo máximo de cinco anos, não foi cumprido. A tal situação se adiciona à inoperância de diversos órgãos, como a Funai – Fundação Nacional do Índio, para compor os grupos de trabalho visando a demarcação e delimitação das terras de ocupação tradicional, o que levou os indígenas a se organizarem para que seus direitos pudessem ser efetivados.

Em 1999, um grupo de indígenas Kaiowá pertencentes à Terra Indígena Takuara, resolveram ocupar o antigo Tekoha Takuara, com vistas a dar celeridade ao processo demarcatório, na atual fazenda Brasília do Sul. No entanto, em 2002, houve a reintegração de posse em favor do proprietário da fazenda, Sr. Jacintho Honório e os indígenas foram obrigados a viverem em um acampamento às margens de uma estrada de barro que liga o município de Dourados ao município de Juti.

Em 2003, ainda decorrente da inércia da Funai no processo de demarcação da referida Terra Tradicional, se realizou a massacre que resultou na morte da liderança indígena, Marcos Veron, mas, somente no 2005 foi entregue o relatório feito pelo grupo de trabalho que realizou o estudo de identificação e delimitação da terra, apresentando uma imensa quantidade de documentos escritos que dão evidenciais materiais não apenas da antiga existência do Tekoha Takuara, mas também de que os índios foram de lá retirados à força, com a ajuda do SPI – Serviço de Proteção ao Índio.

Em virtude dos acontecimentos na fazenda Brasília do Sul e para que a ordem retornasse ao status quo, lançaram-se cruzadas contra os Kaiowá de Takuara com o apoio de meios de comunicação que, em defesa da propriedade, apresentaram um governador de Estado e uma autoridade federal para dar legitimidade ao discurso, contribuindo, assim, na formação da opinião pública. Cite-se como exemplo, a manchete do jornal O Progresso, “Paraguaios se passam por índios no MS: Denúncia feita por O progresso é confirmada pelo governador [...]; Família Veron é uma delas” (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 4.930).

Em sede de conclusão da Nota Técnica, o antropólogo aponta que por afinidade ideológica, um homem branco local ou regional, está mais alinhado às representações sociais aglutinadas à propriedade, do trabalho, da produção, do desenvolvimento econômico, do ser pioneiro, da tradição, do progresso pessoal e regional do que qualquer representação social ligada aos índios. Também, os meios de comunicação, em regra, fazem uso de representações sociais acerca dos índios que acabam por estigmatiza-los e torná-los desacreditáveis.

Estes mesmos meios de comunicação detêm enorme poder de nomear e classificar, o que deixa os leitores expostos aos estereótipos indígenas. Principalmente, que as representações sociais sobre os índios são negativas e se contrapõem ao paradigma do homem pioneiro, tal como o proprietário da fazenda, Sr. Jacintho.

Sobre esse poder atribuido aos meios midiáticos, Giovani Sartori (1998, p. 148) pontua que “como las comunicaciones son un formidable instrumento de autopromoción – […] han sido suficientes pocas décadas para crear el pensamiento insípido, un clima cultural de confusión mental y crecientes ejércitos de nulos mentales”.

Na mesma linha, Eugênio Raúl Zaffaroni e Ílison Dias dos Santos (2020, p. 112) afirmam que “criminalização, vitimização e policização caem predominantemente sobre os mais humildes setores sociais, não sendo difícil estimular o ódio entre eles a partir da criação de uma realidade midiática para gerar violência que impede qualquer diálogo”. Além do mais, assinalam que nos países latino-americanos, como é o caso do Brasil, “os monopólios midiáticos espalham discursos racistas, atribuindo-os a uma natural inferioridade da população […]” (Zaffaroni; Santos, 2020, p. 112).

Em compasso, a referida nota técnica considera que os conflitos entre índios e não-índios é parte integrante do cotidiano do Estado de Mato Grosso do Sul e que conflitos interétnicos similares ao ocorrido em Takuara já aconteceram em outras localidades de forma reiterada, provocando baixas do lado de brancos e dos índios. Consequentemente, este conflito ocasiona o ódio étnico, afirmando-se a necessidade de impedir que estes juízos interfiram no julgamento do caso.

6. O TRIBUNAL DO JÚRI E A DETURPAÇÃO DOS DIREITOS DOS INDÍGENAS

No dia 03 de maio de 2010 deu-se início aos trabalhos do Tribunal do Júri, na cidade São Paulo, com a presidência de uma Juíza Federal Substituta. A Magistrada inicialmente indicou que houve pedido de adiamento pelos réus sob alegação de ausência de condições financeiras para comparecer ao julgamento. Tanto a defesa quanto o MPF – órgão acusatório – não se opuseram à possibilidade de que o órgão jurisdicional custear as passagens áreas e a hospedagem dos réus, desde que o julgamento fosse iniciado na data de 03 de maio e, no dia seguinte, com os réus presentes, fosse dado prosseguimento ao Tribunal do Júri.

No dia 04 de maio de 2010 a sessão de julgamento do Tribunal do Júri foi interrompida em razão do abandono do órgão ministerial. Conforme consta nos autos (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 5.772-5.774), em expediente emitido pela presidente do Tribunal do Júri, o órgão ministerial teria agido à margem da legislação ao abandonar a sessão de julgamento, revelando tal ato desrespeito à magistrada, às partes, às testemunhas, às vítimas e à administração da justiça.

A questão colocada em plenário que ocasionou a reação do órgão ministerial, segunda a magistrada, referiu-se ao indeferimento do pedido que pretendia que os depoimentos de vítimas e testemunhas indígenas fossem colhidos no idioma tupi-guarani, dialeto Kaiowá, através de intérprete. Ao indeferir a magistrada fundamentou que na fase inquisitorial e instrução criminal, todos os depoimentos foram colhidos em português, sem interferência de intérprete, sendo os réus pronunciados com base em tais provas, razão pela qual, no plenário, tais vítimas e testemunhas também poderiam se expressar em português, visto que igualmente, ao menos pelo consta nos autos, dominam o idioma oficial do país.

Com relação ao ocorrido, o MPF juntamente com a Funai impetraram mandado de segurança, sustentando que, em sessão de Tribunal do Júri a magistrada obrigou os indígenas, que haviam sido vítimas de violência armada praticada pelos réus e que funcionavam como testemunhas do processo, a expressar-se em idioma que não dominavam e que, o abandono da sessão foi a única forma existente para que a ofensa ao direito constitucionalmente previsto dos indígenas guarani-kaiowá – à diversidade linguística – não viesse a prejudicar o desfecho do julgamento.

Ao prestar informações a magistrada afirmou que o MPF em momento algum nos autos, exceto na sessão plenária, alegou violação aos direitos dos indígenas, concordando com a colheita de depoimentos, na fase de instrução, sem a presença de intérprete (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 6.059). Por essa razão, afirma a magistrada, que tais indígenas dominariam o idioma nacional, entenderiam e saberiam se expressar em português, autorizando a aplicação do disposto no artigo 223 do Código de Processo Penal Brasileiro, que prevê a atuação do intérprete na hipótese em que a testemunha desconhecer a língua nacional, circunstância em que não teria se verificado, alegou a magistrada.

Na visão da mesma, o ato do MPF foi desarrazoado e ilegal, causando grave prejuízo moral e financeiro à Justiça – frise-se isso, financeiro –, na medida em que mobilizou servidores de vários setores da Justiça, com prejuízo de suas atribuições originais, sem mencionar, segundo a magistrada, o elevado custo para a compra de passagens aéreas, contratação de hotel, alimentação etc. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 6.060). Interessante como a magistrada é enfática ao alegar prejuízo financeiro à Justiça, argumento este que solapa em seu discurso a questão da violação dos direitos dos indígenas a expressarem-se em sua língua materna e a violação ao contraditório e ao devido processo, nos termos do artigo 5º, LIV e LV da CF de 1988.

De toda a forma, superado o episódio narrado, foi designada nova sessão plenária para o dia 21 de fevereiro de 2011. Antes do júri, o MPF juntou aos autos notas técnicas da Antropologia/MADA/n. 001/2011 e n. 002/2011 com o fito de demonstrar a imprescindibilidade da atuação de intérprete na nova sessão. Nas notas o analista pericial em antropologia afirma que “a aceitação mecânica do índio ‘integrado’ e ‘assimilado’ conduz ao falso pressuposto de que os indígenas são bilíngues em todos os domínios, capazes de desempenharem comportamentos idênticos tanto na língua portuguesa, quando na língua nativa” (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 6.423). Frisa ainda a possibilidade de ocorrência do code-switching, ou seja, o fenômeno de mudança de língua dentro de uma mesma fala, seja do guarani para português ou do português para o guarani, que por muitas vezes acontece inconscientemente, sem a percepção do indígena. Para o antropólogo, “a frequência em que acontece o code-switching entre os índios de Takuara é indicativo de que não se enquadram como os bilíngues idealizados, capazes de desempenhar eficazmente em todos os domínios em ambas as línguas – o português e o guarani” (Processo 2003.60.02.000374-2, p. 6.425). E mais, “a incidência do code-switching entre os índios da terra indígena Takuara é de ocorrência corriqueira entre todos os seus familiares, inclusive entre as ‘vítimas e testemunhas’ que serão ouvidas por ocasião da realização do Júri”. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 6.425)

Levando isso em conta, concluiu ser mais do que necessária a utilização de intérprete para os indígenas, mesmo que se considerando o diferente nível de proficiência daqueles que seriam ouvidos na audiência, afinal, para todos eles o português figurava como uma segunda língua e não como língua materna. Logo, a língua em que melhor se expressariam e que melhor entenderiam seria o guarani (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 6.439). Defendeu, por consequência, que as emoções emanadas de todos os fatores anteriores e durante a própria sessão plenária, já bastariam para criar a predisposição psicológica para escolher (consciente e inconscientemente) o guarani e não o português. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 6.440)

As notas técnicas acima destacadas foram levadas à plenário para o conhecimento dos jurados e, conforme fixado, do dia 21 ao dia 25 de fevereiro de 2011 foi realizado novo Júri. Desta vez, sem a ocorrência de novos episódios de violação dos direitos dos indígenas, o Conselho de Sentença decidiu que o acusado Carlos Roberto dos Santos deveria ser absolvido da imputação de ter praticado homicídio contra o cacique Marcos Veron.

Decidiu também o Conselho de Sentença que os três réus, Carlos, Estevão e Jorge, cometeram seis crimes de sequestro, contra as vítimas Adélcia Martins, Cesar Martins Veron, Cipriana Martins, Valdecir Caballeiro, Geisabel Veron e Marcos Veron. Que os réus praticaram um crime de tortura contra a vítima Ládio Veron, com reconhecimento da causa de aumento de pena relativa ao sequestro. Por fim, reconheceu com relação ao réu Estevão o cometimento do crime de fraude processual, praticado para produzir efeito em processo ainda não iniciado.

Fixou-se, de tal forma, a pena definitiva de Carlos Roberto, Estevão e Jorge em 12 anos e 3 meses de reclusão, a serem cumpridos em regime inicialmente fechado. O réu Estevão também foi condenado pela prática do crime de fraude processual, com pena de 6 meses de detenção a ser cumprida em regime inicialmente aberto.

Com relação ao julgado, recorreu a acusação pugnando pela anulação da decisão do conselho de sentença para submeter os réus a novo julgamento pelo Tribunal do Júri, tendo em vista ter sido a decisão manifestamente contrária à prova dos autos, na forma do artigo 593, III, alínea “d” do Código de Processo Penal Brasileiro.

Em 01 de dezembro de 2015, decidiu a Segunda Turma do TRF da 3ª Região – conforme acórdão de fls. 7.108 dos autos –, por maioria, dar parcial provimento ao recurso do Ministério Público Federal, para submeter o réu Carlos Roberto dos Santos a novo júri.

Nos termos do voto-vista vencedor, foi considerado que o acusado Carlos concorreu dolosamente para a morte do cacique Marcos Veron, além do mais, culminam as provas, através do depoimento chave do filho de Marcos Veron, Ládio Veron, que asseverou ter visto seu pai ser espancado, desde o momento em que foram aprisionados e, finalmente morto, apontando a autoria de Carlos, como responsável pelo golpe fatal. (Processo n° 2003.60.02.000374-2, p. 7.107)

Além do mais, que tais fatos foram pormenorizados aos jurados e a respeito do que lhes foi dito, decidiram ignorar para absolver o réu. De tal sorte, entendeu-se que a decisão proferida pelo conselho de sentença negou a existência de prova nos autos e tomou feições de arbitrariedade, necessitando, pois, um novo júri.

A defesa interpôs embargos infringentes, afinal, cabível tal medida com relação de decisões não unânimes e, por obviedade, o MPF se pronunciou pelo não provimento dos embargos infringentes para manter na totalidade o acordão embargado.

Apenas em 30 de abril de 2020 a quarta seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, negou provimento aos embargos infringentes, mantida a decisão que, por maioria, em julgamento de apelação criminal, deu parcial provimento ao recurso do Ministério Público Federal para submeter o embargante Carlos Roberto dos Santos a novo Júri.

Por fim, a última movimentação dos autos data de 25 de agosto de 2020, na qual o a defesa do réu supracitado juntou petição de recurso especial e extraordinário.

7. CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESTADO ATUAL DA SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA CONTRA OS INDÍGENAS NO BRASIL

Segundo dados oficiais da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), no Brasil só no ano de 2019 houve 113 registros de indígenas assassinados. “Os dois estados do país que tiveram o maior número de assassinatos registrados foram Mato Grosso do Sul (40) e Roraima (26)” (Cimi, 2019, p. 7). E mais, “constata-se que em 2019 a população indígena do Mato Grosso do Sul (2ª maior do país) continuou sendo alvo de constantes e violentos ataques, em que há até mesmo o registro de práticas de tortura, inclusive de crianças” (Cimi, 2019, p. 7).

No tocante aos conflitos relativos a direitos territoriais, Mato Grosso do Sul é o estado brasileiro com o maior número de casos. Em 2019 foram registrados dez. Em episódio recente e amplamente divulgado pelos meios de comunicação, “um trator adaptado foi utilizado por fazendeiros em graves ataques contra comunidades indígenas. Segundo os moradores da Terra Indígena Dourados, o trator possuía uma perfuração na lateral, através da qual eram disparados tiros em todas as direções” (Cimi, 2019, p. 72).

Com efeito, é possível notar que a propagação de uma cultura hegemônica e opressora sobre as demais consagrou um verdadeiro massacre de diversas culturas ocidentais, legitimada, antes de mais nada, sob o discurso da necessária evolução da espécie humana. Esta negação do outro – nitidamente relacionada aos povos indígenas – tornou-se fixa e atemporal, não ficando restrita ao período do colonialismo. Em verdade, foi na suposta sociedade globalizada, pós-moderna e utópica, que o discurso da negação do outro manteve-se latente.

Nesse contexto, traz-se à tona a visão de Chantal Mouffe (2015, p. 125), na qual aduz ser necessária a aceitação de que existem “outras formas de modernidade além daquela que o Ocidente está tentando impor no mundo todo, sem respeitar outras histórias e tradições”. Complementa a autora, de que “já está mais do que na hora de abandonar o dogma eurocêntrico de que nosso modelo tem um direito especial sobre a racionalidade e a moralidade”.

Isto posto, uma das grandes consequências deste processo de neutralização da cultura indígena diz respeito a sua morte simbólica, subjetiva, o que Boaventura de Sousa Santos (1999, p. 283) denomina “epistemicídio”8, alcançando a racionalidade do outro, no sentido de desqualificação do próprio conhecimento deste povo subjugado.

Afirma que o “epistemicídio” é considerado como “[...] um dos grandes crimes contra a humanidade” (Santos, 1999, p. 283), o que significa dizer que a devastação e o sofrimento “[...] indizíveis que produziu nos povos, nos grupos e nas práticas sociais que foram por ele alvejados, significou um empobrecimento irreversível do horizonte e das possibilidades de conhecimento” (Santos, 1999, p. 283).

Ora, por não pertencerem à comunidade nacional, assim como diante de sua insignificância perante a estrutura social e econômica, os indígenas foram mantidos à margem da sociedade, status este mantido até os dias atuais. “A separação espacial que produz um confinamento forçado tem sido ao longo dos séculos uma forma quase visceral e instintiva de reagir a toda diferença e particularmente à diferença que não podia ser acomodada nem se desejava acomodar [...]” (Bauman, 1999, p.114).

Essa separação espacial e aversão à diferença é analisada por Amartya Sen, na qual sustenta que a grande maioria dos conflitos e das barbáries no mundo são engendrados “pela ilusão de uma identidade única e sem alternativa. A arte de fabricar o ódio assume a forma de uma invocação do poder mágico de uma identidade supostamente predominante que afoga outras filiações [...]” (Sen, 2015, p. 13). Além disso, adverte que “a ameaça às culturas nativas no mundo globalizante de hoje é, em grande medida, inescapável” (Sen, 2010, p. 308).

É nesse contexto, pois, que se elucida o massacre indígena, que se desenvolveu e ganhou ainda mais força desde o período da colonização, e que agora, na pós-modernidade, evidencia as diferentes esferas de violência que se institucionalizaram e que continuam a subjugar estes povos.

Se no colonialismo identificava-se o indígena como o selvagem, no tardocolonialismo, constrói-se à figura do indígena um bode expiatório com base em estereótipos e estigmas, com a diferença de que hoje o indígena pode ser considerado nocivo para determinado grupos dominantes, a exemplo do Caso Veron, em virtude das disputas por terras que tradicionalmente são suas.

É interessante destacar que os massacres são encobertos por um discurso de suposta neutralidade – aqui entendida como étnica – ou seja, na base, a ideia é de que não haveria qualquer tipo de discriminação contra os indígenas, quando na realidade é possível notar que várias frentes, a exemplo dos meios midiáticos e até instituições supostamente democráticas, como é o caso do Poder Judiciário, atuam de modo a manter a condição de inferiodade dos indígenas. Além do mais, para que proceda à consolidação do massacre é primordial que haja o apoio ou até mesmo a indiferença da sociedade como um todo.

Como bem assinala Isabel Wilkerson (2021, p. 150) em recente obra: “desumanize-se o grupo e estará feito o trabalho de desumanizar todos os indivíduos dentro dele. Desumanize-se o grupo e ele estará isolado das massas a que se pretende conferir superioridade [...]”. Prossegue a autora, ao afirmar que “ter uma casta como bode expiatório se tornou necessário para o bem-estar coletivo das castas acima dela e para o bom funcionamento do sistema [...]” (Wilkerson, 2021, p. 199).

A partir deste ideal de superioridade, é importante assinalar sobre as relações hierárquicas de poder existentes em nossa sociedade e como estas são responsáveis pelas diferenciações entre grupos sociais, cujas consequências não atingem somente o momento presente, mas se prolongam no tempo, configurando verdadeiras violências intergeracionais. Esse processo de estigmatização na qual grupos inteiros estão expostos em virtude de traços característicos na qual compartilham, como é o caso dos indígenas, tem o condão de sepultar qualquer expectativa de uma vida minimamente digna e de consagrar sua inferioridade perante a estrutura social.

[...] a persistência de atos discriminatórios e a constante circulação de estigmas que os legitimam permitem a criação de grupos sociais que se tornam castas com uma vivência social distinta. Estamos falando de pessoas que ocupam os lugares mais baixos na estrutura de classes. Essas pessoas sofrem um processo de isolamento social porque não são reconhecidas como seres humanos. (Moreira, 2020, p. 742)

Notadamente, “normas legais e práticas sociais que estigmatizam grupos de indivíduos criam divisões sociais incompatíveis com a lógica democrática” (Moreira, 2020, p. 86-87).

Por derradeiro, Zygmunt Bauman esclarece que ninguém tem a ganhar com a suspensão da condição de humanidade comum, com a dicotomia entre o “nós” e o “eles”. Segundo o autor, “a universalidade da humanidade não se opõe ao pluralismo das formas de vida humana; mas o teste de uma verdadeira humanidade universal é sua capacidade de dar espaço ao pluralismo e permitir que o pluralismo sirva à causa da humanidade” (Bauman, 2003, p. 126).

8. CONCLUSÕES

No presente artigo relatamos o emblemático caso Veron, buscando retirar o véu da neutralidade étnica que pairava sobre o processo criminal. Inicialmente, destacou-se a insofismável parcialidade de um juiz, candidato ao governo no Estado de Mato Grosso do Sul em 2018, ao julgar procedente concessão de liminar em ação possessória, a favor do proprietário da Fazenda Brasília do Sul, de enorme influência econômica e política na região.

Foi constatado o interesse de membros da magistratura no desfecho do caso, com pretensão de simular trabalhos de advocacia e ainda, repudiando abertamente as ocupações indígenas, dentro do próprio recinto do Júri.

Portanto, não bastasse o poder e influência econômica do proprietário da Fazenda Brasília do Sul, o mesmo estaria assistido por magistrado do Tribunal do Júri evidenciando-se notório impedimento à realização do julgamento dos réus pelo Tribunal.

Constatou-se, ainda, o papel da imprensa sul-mato-grossense que articulou manchetes que tentaram negar a culpa dos réus, assim como com a tentativa de negar a identidade indígena de Marcos Veron ao afirmar que este seria paraguaio.

Por derradeiro, em 04 de maio de 2010, houve o abandono pelo órgão ministerial da sessão de julgamento do Tribunal do Júri. Tal conduta originou-se de ato da magistrada – presidente do Tribunal do Júri – que teria obrigado os indígenas, que haviam sido vítimas da violência armada praticada pelos réus e que funcionavam como testemunhas do processo, a expressarem-se em idioma que não dominavam. De tal sorte, o abandono da sessão foi o meio utilizado pelo órgão ministerial para que a ofensa ao direito constitucionalmente previsto dos indígenas Guarani Kaiowá – à diversidade linguística – não viesse a prejudicar o desfecho do julgamento.

Assim, a partir das lentes teóricas da criminologia crítica lançadas para a análise do emblemático caso Veron, foi possível evidenciar as entranhas deste projeto massacrante, mais que uma tentativa de neutralização deste grupo tão vulnerável, destacou-se a atuação de pessoas com forte influência econômica e social, como o proprietário da Fazenda Brasília do Sul, a mídia que corroborou para que fosse criado no imaginário popular a figura do indígena como um criminoso, o ataque de membros do próprio Poder Legislativo do Estado de Mato Grosso do Sul à imagem dos indígenas, além da atuação de magistrados impelidos por preconceitos étnicos.

Note-se, portanto, que a violência estrutural está enraizada nos aparelhos de controle social e imbricada nas decisões de intuições que deveriam ser imparciais. Da pior das formas, foi legitimada e direcionada para punição de determinados indivíduos notadamente estigmatizados, expostos a práticas repressoras em virtude de traços característicos na qual compartilham.

Inegável, pois, que ainda hoje vigora a crença de que em nosso país não mais substistiria qualquer tipo de discriminação contra indígenas e mais, de que o sistema de justiça criminal seria notadamente democrático e multiético. Verdadeira falácia, afinal, esse véu da neutralidade enconbre uma série de práticas masacrantes, conforme visualizamos acima.

No entanto, crê-se numa saída que enfatize os direitos humanos para o desmantelando desse processo massacrante, pois só esse redirecionamento seria capaz de reconstruir um sistema democrático notadamente multiétnico, liberto das amarras da opressão, da discriminação e da homogeneização cultural. Como aduz Michelle Alexander (2017, p. 354), “o significado disso é enorme, pois o fracasso em reconhecer a dignidade humana de todas as pessoas está na raiz de qualquer sistema de castas raciais”.

9. REFERÊNCIAS

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Brasil, Tribunal Regional Federal da 3ª Região - Processo n. 2003.60.02.000374-2/MS. Disponível para consulta em:http://web.trf3.jus.br

Cárcova, C. M. (1998). A opacidade do direito. LTr.

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Comissão nacional da verdade. (2014). Relatório: textos temáticos/Comissão Nacional da Verdade http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/images/pdf/relatorio/volume_2_digital.pdf

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Mouffe, C. (2015). Sobre o político. Editora WMF Martins Fontes.

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Notas

1 A ideologia parece alcançada, assim, por uma espécie de castigo auto-referencial. Empenhada ela própria em dar conta da aparência, em denunciar o erro, em funcionar às vezes como ideia, outras vezes como materialidade expressiva das práticas sociais, acaba dissolvendo-se numa imensa variedade de sentidos. A atitude de quem não se compromete com a realidade de seu tempo, um credo político, ideias dominantes de uma determinada formação social, a consciência falsa, a relação imaginária com a realidade, o discurso legitimador, tudo pode ser chamado pelo nome de “ideologia”. E, como se sabe, quando a referência de um conceito se estende com tamanha amplitude, quando tudo entra no campo de sua designação, esse conceito se torna inútil (Cárcova, 1998, p. 125).
2 Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.
3 http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/pdf/declaracao_nacoes_unidas_povo_indigena.pdf. Acesso em 14 de maio de 2021.
4 Nesse sentido, “a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) condena o assassinato de Clodiodi Aquileu Rodrigues de Souza, um líder indígena Guarani-Kaiowá de 26 anos, da comunidade de Dourados-Amambai Pegua I, em Mato Grosso do Sul, Brasil. A CIDH manifesta sua preocupação com os altos índices de atos de violência contra as comunidades indígenas Guarani-Kaiowá, especialmente no estado de Mato Grosso do Sul, e urge o Estado brasileiro a que investigue esse assassinato de maneira imediata e com a devida diligência para julgar e punir os responsáveis e evitar sua repetição”. Disponível em: http://www.oas.org/pt/cidh/prensa/notas/2016/089.asp.
5 Disponível em:https://cimi.org.br/pub/relatorio/Relatorio-violencia-contra-povos-indigenas_2003-2005-Cimi.pdf. Acesso em: 21 de março de 2021.
6 Os povos indígenas parecem estar bem abaixo na lista de prioridades de uma administração que tenta fazer malabarismos para lidar com tantas demandas conflitantes. Como resultado disso, eles estão cada vez mais vulneráveis em meio a um clima em que as ameaças de violência estão sempre presentes. Os avanços consideráveis que eles conquistaram desde a Constituição de 1988 correm o risco de serem perdidos. Um lobby poderoso e cada vez mais ruidoso está pedindo que seus direitos sejam reduzidos. Isso, combinado com o fracasso de sucessivos governos em implementar uma estratégia coerente para assegurar o reconhecimento e a proteção de seus direitos, faz com que sua segurança e mesmo sua sobrevivência estejam em perigo. Disponível em: https://www.amnesty.org/download/Documents/80000/amr190022005pt.pdf. Acesso em 21 de março de 2021.
7 Prescreve o referido artigo: Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
8 O genocídio que pontuou tantas vezes a expansão europeia foi também um epistemicídio: eliminaram-se povos estranhos porque tinham formas de conhecimento estranho e eliminaram-se formas de conhecimento estranho porque eram sustentadas por práticas sociais e povos estranhos. Mas o epistemicídio foi muito mais vasto que o genocídio porque ocorreu sempre que se pretendeu subalternizar, subordinar, marginalizar, ou ilegalizar práticas e grupos sociais que podiam ameaçar a expansão capitalista ou, durante boa parte do nosso século, a expansão comunista (neste domínio tão moderno quanto a capitalista); e também porque ocorreu tanto no espaço periférico, extra-europeu e extra-norte-americano do sistema mundial, como no espaço central europeu e norte-americano, contra os trabalhadores, os índios, os negros, as mulheres e as minorias em geral (étnicas, religiosas, sexuais) (Santos, 1999, p. 283).

Autor notes

Pietro de Jesús Lora Alarcón é professor, consultor jurídico e advogado no campo dos direitos humanos. Ele se formou na Unilibre de Colombia em 1991. Doutor em Direito pela PUC/SP -Brasil em 2003. Professor visitante da Universidade Carlos III de Madrid- Espanha e da Universidade de Coimbra- Portugal. Professor da PUC/SP e professor convidado das Universidades Libre de Colombia, Gran Colombia, Guadalajara (México). Assessor para a paz e intercâmbio humanitário da Comissão de Notáveis da República da Colômbia no processo de paz (2004). Ex-secretário executivo da Cátedra Sergio Vieira de Melo do ACNUR na PUC/SP. Atualmente assessor do Fórum Internacional de Vítimas FIV-Colombia e membro da AAJ - Associação Americana de Juristas, Capítulo Brasil.
Karine Cordazzo é professora, advogada e doutoranda em Sistema Constitucional de Garantia de Direitos no Centro Universitário de Bauru/SP-Brasil. Graduada em Direito pelo Centro Universitário da Grande Dourados - UNIGRAN (2015). Mestre em Fronteiras e Direitos Humanos pela Universidade Federal da Grande Dourados - UFGD (2019) e Diplomada em Saber Penal y Criminología pela Asociación Latinoamericana de Derecho Penal y Criminología - ALPEC (2019). Professora dos cursos de graduação e pós-graduação em Direito Público do UNIGRAN e da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

Informação adicional

Cómo citar / citation: Lora, P.J y Cordazzo, K. (2021). Violência, conflito e omissão na proteção dos indígenas no brasil: o caso Veron, Estudios de la Paz y el Conflicto, Revista Latinoamericana, Volumen 2, Número 4, 80-98. https://doi.org/10.5377/rlpc.v2i4.11481

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